quarta-feira, 28 de julho de 2010

De boca em boca




Sentou na calçada e mal podia crer no que estava se passando ali, acolá ou em qualquer lugar. Seu corpo formigava de tanto amor, como a dor que se sente quando não há como descrever. Pensou que poderia pesar nos braços aquele bebê, pensou que a mãe não era só prazer era a possibilidade de vida. Pensou que ser amante não era compatível com a posição de “Ricardão viúvo” que se debatia dentro da cabeça. A notícia veio através das bocas mal lavadas da freguesia.

Enfiou a mão no bolso e sentiu no pedaço de papel o cheiro, o gosto e tudo o quanto é tolice brega. Era um cartão que ela havia entregado no dias antes e pedido para que ele lesse só quando soubesse que era hora. Enfim, já havia passado. A carne estava mais fria que a certeza. Amassou o cartão como se consumisse seu conteúdo e atirou-se na lanchonete. Sem qualquer resposta, apenas o avental sujo

No balcão uma senhora tomava o seu pingado com uma fatia de queijo indigesta. Ela mastigava e ele parecia saber o tamanho exato de cada pedaço triturado. O som daquela boca sugando o café fazia o corpo tremer. No exato momento em que aquilo tudo passava de incômodo para um mantra a faca caiu quebrando o transe. Com a ponta voltada pros pés do atendente, aquela faca serviu de pretexto para que a dona lhe dissesse “Verdade ou consequência?”

Na boca o queijo e o hálito de café se misturavam em sentença de vida. Ele pediu a verdade e ela não pestanejou “Você prefere sangue ou maionese?”

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