domingo, 27 de junho de 2010

clark nada kent


É um herói! Sempre foi. Desde pequeno, desde o dia em que ganhou seu primeiro troféu de natação. A mãe apostou a vida no filho. O pai apostou a vida no jogo. Por isso foi embora antes que o menino se tornasse rapaz, antes que o menino aceitasse as condições de viver em uma eterna fuga.

Esportes foram todos, com méritos variados. Os desafios se tornavam pequenos, a vida se tornava vazia e ele começava a se lembrar das coisas que ouviu. Das coisas que a mãe fez a ele depois que o pai partiu. Ser o homem da casa era cumprir com obrigações que ele nem sequer conhecia aos oito anos de idade. Certamente isso justifica seu comportamento receoso na cama da namorada, a admiração exagerada pelo sogro e o desdém com que trata as demais pretendentes que se oferecem em busca de seu corpo de deus grego.

Decidiu salvar vidas aos dezenove. Não deveria desperdiçar tanto talento e tanta força em qualquer outra coisa sem importância. Estudou, concursou, correu, pulou e passou. Se apaixonou pelos elogios da mãe, se apaixonou pela atenção que recebia em cima do pódio, se apaixonou pela imagem que via no espelho. Se masturba ali, em frente a ele. Observando-se, satisfazendo-se da forma que não consegue com mais ninguém, com mais nada.

O casamento está marcado, a mãe esta dando pulos de alegria. Já pensa nos netos, nos almoços de domingo, no orgulho que vai exibir na igreja para todos os convidados. Mais uma vez o filho no lugar mais alto, mais uma vez o seu menino seguindo o caminho dos campeões.

Leite em pó


Dizem que há mulheres mal amadas. Isso exclui aquelas que não desejam ser amadas. Há a opção. É isso o que ela prefere: o não amor. Sem pensar no que poderia ser pior, casou-se com quem não poderia ter problemas. Na época não estava apaixonada por aquele homem e por isso mesmo apaixonou-se pela ideia de não sofrer.

A mulher sempre procurou a tranquilidade de um bom lar, afinal, queria o melhor para a sua filha. Os gemidos do marido durante a noite ela tolera em silêncio. O jeito que o macho bafora durante o acasalamento ela tolera. O modo como o animal mastiga de boca aberta ela tolera. Tudo em prol de sua cria.

O que não sabia controlar dentro de si é a ansiedade que só passa com uma boa xícara de café. Os dedos dos pés encolhem ao final do efeito da cafeína. Contrai os músculos, deixando doloridas a carne e as unhas.

Apesar de ser um exemplo de menina, a filha não perdoou nenhum dos colegas de sala ao final do colegial. Hormônios. Aos vinte e quatro conheceu o namorado. Hormônios. Aos vinte e cinco decidiu se casar depois de ter traído o seu homem. Gostou de trair, valeu o sexo. O bombeiro não sabia acender o fogo. Mas esse não era o objetivo.

Para ela o atendente da lanchonete é bom demais no que faz, mas não podia solucionar seus problemas financeiros. Não serve, não vale a pena. A frieza natural com a qual a filha lida com o amor foi repassada pelo leite até os dois anos de idade. Assim que largou os seios da mãe já podia caçar sozinha.

Dizem que deus não dá asa às cobras. Não acredito em cobras.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

rebolation


A chuva sempre tira um pouco da sua paciência. O ponto de ônibus é quase um exílio enquanto a vida acelera pelo asfalto molhado. A vontade de perpetuar a espécie é tão pouca que se o mundo dependesse disso, certamente não seria sua fé que o levaria ao ato, mas sim as vantagens que lhe oferecessem em troca.

Todos os dias se confessa. Pede perdão pelo que não fez e veste seu terno. Viver de acordo com as leis do próprio homem é mais difícil do que Deus imagina. Mas nenhum dos dois consegue perceber isso.

O negocio não é dos melhores, a vizinhança não é tão boa assim. A mulher fala pelos cotovelos enquanto a filha namora um bombeiro. Apesar do dinheiro não ser ruim, ele prefere uma vida de pouco luxo, ao menos pra ele, já que as duas fêmeas são dadas a excessos e exceções.

A chuva o faz olhar mais pra fora da janela. O ônibus enche e ele não se sente a vontade encarando os pedaços de gente que se espremem a sua volta. Trabalha das oito as dezoito, come num restaurante a quilo e toma um café todos os dias ás três e quinze. Ás vezes fuma um cigarro. Masca três chicletes pra tirar o gosto da boca e pra que a mulher não perceba. Não se sabe o que realmente o motiva a isso. O mau gosto ou a falação da mulher?

Dizem que a filha vai casar, dizem que ele vai se aposentar e se mudar com a mulher pra zona rural. Dizem que ele tem bastante dinheiro guardado. Dizem coisas demais sobre um homem tão desnecessário como ele.

genitália sem açúcar





O atendente sempre carregou aquele café com mesmo cuidado que segurava o próprio pau para mijar. O sujeito sempre reclamou que servia o café entornado. O sujeito não passa de um merda que vai morrer bebendo mijo.


O cara, com aparência de lutador bebe café todos os dias na lanchonete. Puro. Sem açúcar. Às vezes pão com manteiga. Às vezes queijo quente. O humor varia. A fome varia.


O atendente vira o rosto e vê a moça passar do outro lado do vidro. Acena para a moça. Em seguida ela encontra o sujeito do café puro e sem açúcar, embora ele seja sem sal também.


A moça trabalha na loja ao lado da lanchonete e vende peças íntimas. O atendente passa pela loja e vê pelo vidro a moça e sempre imagina ela vestida com o que estiver no manequim.


A moça,com vergonha pelo tamanho de sua genitália, não usa lingerie ousada demais. Bebe café compulsivamente o que faz com que ela frequente a lanchonete várias vezes ao dia. Nunca aparece na hora em que o namorado está.

Alguns animais fazem suas refeições sozinhos.