segunda-feira, 2 de agosto de 2010

a queda das lágrimas


Todos desfilando o luto. O preto de todas as roupas, as lágrimas e a incompreensão. Ele lá estava, mas ali não queria ficar. Pediu licença a sogra, beijou a mão da mãe e saiu em busca de ar fresco. Na capela ao lado mais um defunto a se deteriorar. Dentro dela apenas três mulheres, pareciam mãe e filhas. Ele as observava como quem olha e não vê. Até que uma delas veio pra fora e acendeu um cigarro.

Os dois se olharam, conversaram e ela era excêntrica, estranha e despertava nele uma sensação de ódio e conforto. Ódio por ela o fazer lembrar-se da outra, e conforto por ela ser a única pessoa entre todas que estavam naquele cemitério a não sentir nenhuma pena dele.

Convidou-a para um café. Descobriu que quem havia morrido era uma tia dela que já estava muito velha. Descobriu também que aquela estranha mulher conseguia sorrir como uma menina e ser irônica e doentiamente fria. Também descobriu que ela carregava uma pequena garrafa de uísque na bolsa e que uísque com café alivia a dor da perda.

Saíram de perto de todos, foram até os túmulos e lá ela acendeu um baseado. Ele que não tinha nada a perder pitou pela primeira vez em sua vida, e enquanto tentava explicar pra ela o motivo dos postes acenderem sozinhos quando a noite chega foi surpreendido por um beijo entre as arvores e as cruzes. Hesitou por um momento, lembrou da outra e afastou a boca da menina desbocada da sua. Olhou-a no fundo dos olhos, assustada, indefesa, perdida e ao mesmo tempo fascinante e tão descompromissada e livre. Foi fácil e absolutamente delicioso descontar toda a sua dor entre aquele belo par de pernas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário