terça-feira, 31 de agosto de 2010

bico calado


Não havia o que fazer. Mais uma noite sem dormir, outra manhã ás seis em que o despertador servia apenas pra lhe avisar a hora de parar de tentar. Todos choravam suas magoas, volta e meia algum cliente tocava no assunto, comentava a morte, o desaparecimento, a loja que não abria há dias. Volta e meia alguém especulava milhões de justificativas pra tudo o que estava acontecendo, mas ninguém sabia o que acontecia com ele.

Não ter direito ao luto é algo ingrato. Não ter direito de se lamentar, de pedir ajuda, de sofrer. Ele sangrava cada vez que olhava a vitrine da loja, ele sangrava cada vez que se lembrava dos sorrisos dela, ele sangrava cada vez que relembrava tudo o que havia acontecido entre eles naquele balcão.

Depois das seis fechou a lanchonete e resolveu se entregar em busca de uma saída. Aquela cachaça já estava guardada ali fazia tempo, quando se deu conta ele já estava na vitrine chorando e se perguntando o que poderia ter feito pra impedir o que aconteceu. Já era tarde da noite quando ele resolveu que queria entrar na loja.

Uma chave inglesa, um pé de cabra, uma garrafa de cachaça e um coração partido. Já dentro ele vasculhava as gavetas, encontrava papeis com a letra dela, via as fotos que ficavam no escritório, mexia nas roupas e peças íntimas imaginando que ela as havia tocado. Ajoelhado no chão entre lágrimas ele nem percebeu as sirenes. Não faria diferença, ele já estava preso ao que não foi, mas poderia ter sido.

Nenhum comentário:

Postar um comentário